Em relação à publicação na edição de 15 de outubro de 2020 da revista Sábado, assinada por Carlos Rodrigues Lima, segundo a qual estaria a ser investigado por “suspeita de facilitar doutoramentos a estudantes dos PALOP,” gostaria de dizer o seguinte:

1. O senhor jornalista telefonou-me no dia 12 de outubro de 2020, perguntando-me se já havia prestado declarações em inquérito aberto pelo Ministério Público, ao que respondi nada saber sobre o assunto, sendo agora a opinião pública confrontada na edição em papel da Revista com um conjunto de afirmações suplementares de que esse artigo faz eco, às quais importa responder.

Reafirmo aquilo que já havia tido a oportunidade de dizer, desconhecendo em absoluto o quer que seja sobre as supostas investigações, obviamente prestando os esclarecimentos que forem solicitados pelas autoridades competentes, onde e como por bem entenderem.

2. É sabido o meu trabalho de há muitos anos a esta parte em instituições académicas lusófonas, às quais me ligam laços institucionais, tendo inclusivamente, em dois períodos da minha vida, vivido em Moçambique (1993-1995) e em Angola (2001), então contratado em funções de cooperação.

Essa atividade tem sido um trabalho jurídico tanto no âmbito da investigação científica – com a publicação de numerosas publicações, de que evidencio o Direito Constitucional de Angola e o Direito Constitucional de Moçambique – como no plano do ensino académico – com a coordenação e a lecionação de disciplinas da minha especialidade em várias áreas do Direito Público e nestes países africanos lusófonos.

Friso as seguintes instituições onde tenho lecionado nos últimos tempos, esporadicamente dando conferências nestas e noutras instituições africanas lusófonas: Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto (FDUAN) e Academia de Ciências e Tecnologia de Angola (Angola); Faculdade de Direito da Universidade Católica de Moçambique e Instituto Superior de Ciências e Tecnologia Alberto Chipande (Moçambique); Instituto Superior de Ciências Jurídicas e Sociais (Cabo Verde).   

3. Fruto dessa longa experiência acumulada, propus que a Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa (FDUNL), instituição a que pertenço desde a primeira hora e onde me doutorei em 1999, pudesse ter uma experiência inovadora de doutoramentos em associação, sabendo bem da carência de condições para estes nossos países irmãos crescerem na capacidade do seu corpo docente doutoral no domínio do Direito.

Isso foi feito, primeiro, com o ISCTEM – Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique (2007) e depois com a FDUAN – Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, tendo já os seus frutos, com vários doutores que defenderam os seus graus em provas públicas que tiveram lugar em Maputo e em Luanda.

O programa FDUNL-ISCTEM foi depois descontinuado por a instituição moçambicana não ter, entretanto, passado a universidade, decisão que sempre achei controversa e que me mereceu reparo formal nos procedimentos administrativos próprios junto das agências de acreditação de Portugal e Moçambique, sobretudo por ter implicado a frustração de expectativas de alguns alunos ainda inscritos e aplicando-se retroativamente nova legislação contrariando norma clara que o proíbe da própria Constituição de Moçambique.

O programa FDUNL-FDUAN mantém-se, já com duas edições, tendo sido o mês de setembro de 2020 o momento para as provas de defesa pública dos primeiros doutores, a 3ª delas terá lugar amanhã.

4. Na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, tenho sido professor de vários cursos – licenciatura, mestrado e doutoramento – e tive a ocasião de propor a criação, julgo que em 2006, de um novo mestrado em direito e segurança e, em 2012, de um novo doutoramento em direito e segurança, que tenho coordenado e nos quais tenho lecionado, com as alterações normais que a distribuição do serviço docente em cada ano letivo determina, além de ser orientador de vários mestrandos e doutorandos em cursos pós-graduados, e não apenas destes.

A respeito da insinuação de “facilitação de doutoramentos com alunos PALOP´s”, aqui fica um esclarecimento abrangente porque no referido escrito não percebi a que doutoramento se faz referência, sendo certo que todas as provas para a obtenção do grau de doutor foram públicas e regularmente organizadas (às quais tenho presidido na minha qualidade de presidente do conselho científico por delegação do reitor da UNL) e sendo também certo que todas as notas foram divulgadas nos termos próprios e estão arquivadas nos registos das instituições respetivas, tendo eu por hábito até publicar no meu site pessoal a notícia de tais provas (www.jorgebacelargouveia.com).

5. Como coordenador deste doutoramento em direito e segurança desde a primeira hora, tenho desempenhado as competências atribuídas pela lei e regulamento aplicáveis de gestão administrativa do mesmo, havendo a separação de poderes entre (i) quem coordena administrativamente, (ii) quem leciona e avalia os estudantes de cada disciplina e (iii) quem coordena cientificamente os programas, competência esta que, pelo art. 5º, nº 1, do ECDU, é exclusiva dos professores catedráticos (e que tenho acumulado dada a escassez de professores da casa com esta categoria profissional, exigindo a lei, além do mais, uma habilitação própria não fácil de encontrar nesta área de interseção entre o Direito e a Segurança).

 Acresce ainda dizer que os estudantes são admitidos por concurso público internacional e a sua escolha é feita por um júri composto por três professores, dele fazendo parte, podendo aceder a este curso mestres e, subsidiariamente, licenciados com acrescido currículo científico, pedagógico ou profissional, nos termos do regulamento existente e em conformidade com a legislação dos graus académicos.

6. Mas o referido texto vai mais longe e faz uma alusão pejorativa a “processos disciplinares” – no plural – de que havia sido alvo na FDUNL, dando a entender que os mesmos se relacionavam com este tema.

Ora, o certo é que – que eu saiba e ainda não há processos disciplinares secretos… – houve um único processo disciplinar, que me foi instaurado pelo reitor da UNL em agosto de 2019, a pedido da diretora da FDUNL, ao qual a revista Sábado, numa notícia sobre uma sua suposta acumulação ilegal de funções, fez menção antes do verão, escrita pelo jornalista Bruno Faria Lopes.

Esse processo disciplinar foi arquivado em janeiro de 2020 e teve que ver – digo-o com tristeza – com o facto de se ter considerado que a divulgação de uma carta aberta que na altura redigi pedindo que se repensasse a errada ideia de deslocar a NOVA Direito de Campolide para Carcavelos devia ser objeto de punição disciplinar por o seu conteúdo representar a prática de infrações disciplinares graves, como foi pedido pela participante.

7. Faz-se finalmente uma bizarra referência a supostas pressões exercidas sobre a A3ES em relação a cursos académicos que não são especificados, dando a entender tratar-se de matéria criminal, não percebendo eu sequer o sentido das insinuações.

Deve afirmar-se que, na minha qualidade de presidente do Conselho Científico da FDUNL e estando para isso escalado, não pude reunir com a CAE em dezembro de 2019 quando esta instituição nos visitou devido a um impedimento pessoal de última hora, tendo disso dado conhecimento ao seu presidente, e tendo-me feito substituir.

Também pude acompanhar a CAE que foi a Luanda para fazer a acreditação do curso de doutoramento em direito em associação FDUNL-FDUAN, disponibilizando as informações requeridas e dissipando todas as dúvidas.

8. Só posso, por isso, repudiar com toda a veemência o teor desta “notícia”, pelas incorreções, imprecisões e falta de fidedignidade das (supostas) fontes utilizadas, sentindo-me na obrigação de redigir o texto que agora publicito.

Lisboa, 15 de outubro de 2020.

Jorge Bacelar Gouveia

Deixe um comentário

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Post comment