Anteprojeto de Lei-Quadro das Associações Públicas Profisisonais
ANTEPROJECTO DE LEI-QUADRO DAS ASSOCIAÇÕES PÚBLICAS PROFISSIONAIS
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Artigo 1°
Conceito
As associações públicas profissionais são associações públicas representativas de profissões que, por desenvolverem actividades de interesse público de especial relevo, devem ser sujeitas ao controlo do respectivo acesso e exercício, à elaboração de normas técnicas e deontológicas específicas e a uma estrutura disciplinar autónoma.
Artigo 2°
Atribuições
1 – São atribuições das associações públicas profissionais:
a) A representação e defesa da profissão;
b) A regulação do acesso e do exercício da profissão;
c) A elaboração e actualização do registo profissional;
d) O exercício do poder disciplinar sobre os seus membros;
e) A prestação de serviços aos seus membros;
f) A colaboração com a Administração Pública na prossecução de fins de interesse público relacionados com a profissão;
g) Quaisquer outras que lhes sejam cometidas por lei.
2 – As associações públicas profissionais estão impedidas de exercer actividades de natureza sindical.
Artigo 3°
Criação, modificação e extinção
1 – As associações públicas profissionais são criadas, modificadas e extintas por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei do Governo autorizado.
2 – A lei de criação de cada associação pública profissional aprova simultaneamente os respectivos estatutos, devendo em relatório preambular justificar devidamente a necessidade da sua criação, bem como as opções que neles foram tomadas.
Artigo 4°
Inscrição
1 – O exercício de profissão organizada em associação pública fica condicionado a inscrição prévia.
2 – Os requisitos de que depende a inscrição em cada associação pública profissional são taxativamente definidos por cada estatuto profissional, com respeito pelos seguintes princípios:
a) Existência de uma habilitação, profissional ou curricular, oficialmente reconhecida;
b) Verificação das capacidades profissionais pela sujeição a estágio ou a período probatório.
3 – O preenchimento dos requisitos a que se refere o número anterior gera o direito à respectiva inscrição.
Artigo 5°
Estatutos
1 – Os estatutos das associações públicas profissionais devem regular as seguintes matérias:
a) Âmbito;
b) Organização interna;
c) Aquisição e perda da qualidade de membro;
d) Espécies de membros;
e) Direitos e deveres dos membros;
f) Incompatibilidades específicas;
g) Regras sobre eleições e respectivo processo eleitoral;
h) Princípios gerais relativos ao exercício da profissão;
i) Regras respeitantes à deontologia profissional;
j) Regras gerais sobre estágios;
k) Regras relativas ao processo disciplinar e respectivas penas;
l) Regime económico e financeiro, em especial relativo à fixação e cobrança e repartição de quotas.
2 – As associações públicas profissionais podem elaborar propostas de modificação dos respectivos estatutos, as quais são aprovadas nos termos do nº 1.
Artigo 6º
Tutela administrativa
As associações públicas profissionais estão sujeitas à tutela de legalidade do Governo, nos termos gerais.
CAPÍTULO II
ORGANIZAÇÃO INTERNA
Artigo 7°
Âmbito geográfico
1 – As associações públicas profissionais têm âmbito nacional.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, as associações públicas profissionais podem compreender delegações regionais e locais, às quais incumbe a prossecução das suas atribuições na respectiva área.
3 – O estatuto de cada associação profissional deve especificar quais as delegações regionais e locais em que esta se estrutura.
Artigo 8º
Colégios de especialidade
Sempre que a natureza da profissão em causa o justifique, as associações públicas profissionais podem organizar-se internamente em colégios de especialidade.
Artigo 9°
Formação democrática dos órgãos
1 – Os titulares dos órgãos das associações públicas profissionais são sempre eleitos por sufrágio universal, directo, secreto e periódico.
2 – Qualquer membro efectivo com a inscrição em vigor pode ser eleito para os órgãos da respectiva associação.
3 – Os estatutos de cada associação profissional podem condicionar a elegibilidade para o cargo de bastonário ou de membro do órgão com competência disciplinar à verificação de um tempo mínimo de exercício da profissão, nunca superior a dez anos.
4 – Têm direito de voto todos os membros efectivos com inscrição em vigor e no pleno exercício dos seus direitos.
Artigo 10º
Órgãos
1 – As associações públicas profissionais têm três órgãos:
a) Um órgão executivo, com uma composição colegial restrita;
b) Um órgão deliberativo, com uma composição de assembleia;
c) Um órgão de fiscalização, com uma composição entre 5 e 7 membros.
2 – Os mandatos dos titulares dos órgãos das associações públicas profissionais são de quatro anos.
3 – Os estatutos das associações públicas profissionais podem prever a existência de um presidente ou bastonário, integrado no órgão executivo ou desempenhando autonomamente as suas competências de representação da associação.
4 – Os órgãos das associações públicas profissionais são independentes entre si, não podendo qualquer um deles destituir os outros.
5 – A denominação dos órgãos é livremente estabelecida pelo estatuto de cada associação pública profissional.
Artigo 11º
Órgão executivo
1 – O órgão executivo é escolhido com base num sistema maioritário, a uma volta.
2 – O órgão executivo exerce poderes de direcção e de gestão, nomeadamente em matéria administrativa e financeira, bem como no tocante à representação externa dos interesses da associação.
Artigo 12º
Órgão deliberativo
1 – O órgão deliberativo representa a totalidade dos membros e é escolhido com base num sistema eleitoral proporcional.
2 – O órgão deliberativo exerce poderes deliberativos gerais, nomeadamente em matéria de aprovação do orçamento e do plano de actividades, podendo fazer propostas relativamente à alteração dos estatutos ou à celebração de protocolos com associações estrangeiras congéneres.
3 – Cada estatuto pode ainda prever a existência de reuniões alargadas, em congresso, para deliberar sobre certas questões de carácter mais geral, com uma periodicidade nunca inferior a dois anos.
Artigo 13º
Órgão fiscalizador
1 – O órgão fiscalizador vela pela legalidade da actividade exercida pela associação e é escolhido com base no sistema eleitoral de representação proporcional.
2 – O órgão fiscalizador exerce poderes de controlo, nomeadamente aplicando sanções disciplinares e financeiras.
Artigo 14°
Poder regulamentar
1 – As associações públicas profissionais elaboram regulamentos internos sobre todas as matérias cujo desenvolvimento lhes seja cometido pelos respectivos estatutos.
2 – Os regulamentos aprovados pelas associações públicas profissionais vinculam todos os seus membros e, bem assim, os candidatos ao exercício da profissão.
Artigo 15°
Poder disciplinar
1 – As associações públicas profissionais exercem acção disciplinar sobre os seus membros, nos termos dos respectivos estatutos.
2 – Os estatutos de cada associação pública profissional devem tipificar as penas disciplinares aplicáveis, bem como os factos que podem dar origem à respectiva imposição.
3 – As penas disciplinares de suspensão e expulsão da associação pública profissional apenas são aplicáveis às infracções praticadas no exercício da profissão, jamais podendo ter origem no não pagamento de quotas.
4 – A pena disciplinar de expulsão é sempre aplicável quando, pela natureza da profissão em causa, a prática de infracção disciplinar possa pôr em causa a vida, a integridade física das pessoas ou valores equivalentes.
5 – O exercício das funções disciplinares das associações públicas profissionais deve ser cometido a um órgão de fiscalização, distinto do órgão de direcção.
6 – Em tudo o que não estiver regulado no estatuto de cada associação pública profissional são aplicáveis as disposições do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local.
Artigo 16º
Incompatibilidades no exercício de funções
1 – O exercício das funções executivas e de fiscalização em órgãos das associações públicas profissionais é incompatível entre si.
2 – O cargo de titular de órgão das associações públicas profissionais é incompatível com o exercício de quaisquer funções dirigentes na função pública e sempre que esteja em causa uma outra função com a qual se registe um manifesto conflito de interesses.
Artigo 17º
Referendo interno
1 – As associações públicas profissionais podem realizar referendos com carácter vinculativo ou consultivo sobre questões de particular relevância para a profissão, por decisão do órgão deliberativo.
2 – São obrigatoriamente submetidas a referendo interno as propostas de dissolução da associação, de modificação dos respectivos estatutos e de adopção do código deontológico.
3 – Os estatutos de cada associação pública profissional podem especificar outras questões a submeter obrigatoriamente a referendo interno.
CAPÍTULO III
REGIME LABORAL, FINANCEIRO E FISCAL
Artigo 18º
Pessoal
Os trabalhadores das associações públicas profissionais regem-se pelo regime do contrato individual de trabalho.
Artigo 19º
Orçamento
As associações públicas profissionais têm orçamento próprio, proposto pelo órgão executivo e aprovado pelo órgão deliberativo.
Artigo 20º
Receitas
São receitas das associações públicas profissionais:
a) As quotizações dos seus membros;
b) As taxas cobradas pela prestação de serviços;
c) Os rendimentos do respectivo património;
d) Os subsídios públicos;
e) Heranças, legados e doações.
Artigo 21º
Fiscalização pelo Tribunal de Contas
A actividade financeira das associações públicas profissionais sujeita-se à fiscalização do Tribunal de Contas.
Artigo 22º
Isenções fiscais
As associações públicas profissionais estão isentas de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, bem como do imposto municipal de sisa na aquisição de bens imóveis para a instalação dos seus serviços.
Artigo 23º
Despesas e contratação
A realização de despesas, bem como a actividade de contratação em bens e serviços, submetem-se ao regime geral das despesas e da contratação públicas.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Artigo 24º
Intervenção dos tribunais administrativos
1 – Os litígios emergentes de relações jurídicas administrativas são da competência dos tribunais administrativos, nos termos gerais de Direito.
2 – Os regulamentos emanados dos órgãos das associações públicas profissionais estão sujeitos à declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, nos termos gerais de Direito.
Artigo 25º
Intervenção dos tribunais comuns
Nos casos em que não se justifique a intervenção específica dos tribunais administrativos, a composição dos litígios é da competência dos tribunais comuns.
Artigo 26°
Responsabilidade civil
As associações públicas profissionais respondem civilmente pelos actos e omissões dos seus órgãos, agentes ou representantes, nos termos gerais de Direito.
Artigo 27°
Intervenção em processo penal
Para efeitos de defesa dos direitos ou interesses profissionais dos seus membros, as associações públicas profissionais podem constituir-se assistente em todos os processos penais relacionados com o exercício da profissão que representam ou com o desempenho de cargos nos seus órgãos.
Artigo 28°
Isenções em processos judiciais
As associações públicas profissionais estão isentas de custas, preparos e imposto de justiça em qualquer processo em que intervenham.
Artigo 29º
Comissões instaladoras
1 – Até à tomada à posse dos órgãos das associações públicas profissionais, os estatutos devem prever, pelo período máximo de três anos, a existência de comissões instaladoras, a quem se incumbe a prática dos actos necessários à instalação definitiva daqueles órgãos.
2 – As comissões instaladoras são compostas por três membros, sendo um deles o Presidente, todos nomeados pelo Governo.
Artigo 30º
Conselho Nacional das Associações Públicas Profissionais
1 – É criado o Conselho Nacional das Associações Públicas Profissionais, com a seguinte composição:
a) Três representantes nomeados pelo Governo, sendo um deles o respectivo presidente;
b) Quatro representantes das associações públicas profissionais, a eleger de entre todos os associados, pelo sistema proporcional, para um mandato de três anos.
2 – O Conselho Nacional das Associações Públicas Profissionais tem as seguintes competências:
a) Dar parecer sobre as alterações dos estatutos das associações públicas profissionais;
b) Recomendar aos órgãos competentes a produção dos actos legislativos necessários ao bom enquadramento das associações públicas profissionais;
c) Receber queixas de cidadãos membros das associações públicas profissionais que se considerem prejudicados pelas suas decisões, intercedendo a seu favor junto das instâncias administrativas
3 – O Conselho Nacional das Associações Públicas Profissionais funciona junto da Presidência do Conselho de Ministros.
Artigo 31º
Direito subsidiário
São subsidiariamente aplicáveis às associações públicas profissionais as normas e os princípios que regem as associações de Direito Privado ou as normas e os princípios que regem os institutos de Direito Administrativo, consoante a natureza das matérias que careçam de solução reguladora.
Artigo 32º
Denominação de “Ordem”
As associações públicas profissionais têm a denominação de “Ordem” quando correspondam a profissões cujo exercício é condicionado à obtenção prévia de uma habilitação académica de licenciatura ou equivalente.
Artigo 33º
Revisão de estatutos anteriores
O Governo deve promover junto da Assembleia da República a revisão dos estatutos das actuais associações públicas profissionais na sequência da aprovação da presente lei-quadro, apresentando as competentes propostas de lei no prazo de dois anos a contar da sua entrada em vigor.
Artigo 34º
Lei geral da República
O presente diploma é uma lei geral da República.
Artigo 35º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2002.